segunda-feira, 9 de julho de 2012

Cascata da Usina

Verdes águas raivosas e espumantes
Mergulhando dos céus, nas pedras quebrando
Grandes piscinas profundas formando
Oásis celeste, prodígios fulgurantes
Trazendo emoções, natureza, amantes
Meu universo, minha catedral cantante.

Imaginem em tempos idos, remotos
Cercada de verdes e virgens florestas
Os animais todos, os índios estupefatos
Saciando a sede, índias esbeltas
Molhando a pele morena em noites de festas
E os deuses consentindo, monumentos intactos.

Deixemos o homem branco de fora
Com suas heresias, ignorante, profano
Deixemos a verde floresta, os deuses ditando
Naquele paraíso os espíritos vivendo
Os guarás em noite de lua, uivando
Protestos aos céus, os anjos ouvindo
As águas caídas das pedras, quebradas
Lambendo suas verdes margens, pedindo
Não toquem em mim, respeitem-me, imploro
Deixem os animais primitivos em mim vivendo
Deixem os índios  suas mulheres divinas amando
Sem maldades, com a natureza sintonizando
Parem o tempo, congelem a imagem
Coloquem-na numa redoma de vidro
Para que, intocada para todo sempre
Permaneça viva com os sonhadores
Dos verdes tempos, dos grandes amores
Com meus mistérios... eternamente.

Luiz Bavaresco
Nova Prata, 17 de junho de 1996.

segunda-feira, 2 de julho de 2012

Despedida

No meu longo caminhar
Muitas coisas pude ver
E agora ao entardecer
Me pus a meditar
Valeu a pena assim ser
Valeu a pena assim andar.
Conheci no meu caminho
Depessoas, toda sorte
Tenho pisado em espinhos
Tenho esbravejado forte
Tenho andado de mansinho
Sempre voltado ao norte.
Andanças de travessias
Ventos fortes, maresias
Mil pedaços, sinfonias
Muitas pedras pontiagudas
Mas também muita alegria.
Peço licença, vou-me embora
Noutros campos vou morar
Aos que me fizeram bem, agora
Meu abraço, meu rezar
Aos outros, não sei quem são
Nunca os vi, foi muito bom
Pouparam meu coração
Que nunca soube blefar.

Poesia criada em novembro de 1995, Arroio do Meio.

domingo, 1 de julho de 2012

O Renegado

Sou um velho andarilho descalço
Meus calcanhares partidos, sangrando
Sigo minha triste sina implorando
O sangue vermelho as pedras manchando
Ouvindo escárneos, minh´alma chorando
Meu Deus! Minha trilha só teve percalços...
Doutores, senhores, piedade
Dêem-me subsídios, caridade
Não sofro nenhuma insanidade
As noites tão longas, escuras
Meu ser geme as agruras
De minha família, quanta saudade.
Tenho tido grandes alucinações
Estive diante de Deus poderoso
Tem-Se mostrado comigo Bondoso
Disse-Me: querido filho!
Isso é uma provação
Em tua efêmera passagem
Tu és minha imagem
Sofrerás grandes humilhações
Verás nos homens a falsidade
Dos orgulhosos, dos prepotentes
Apegados aos seus tesouros
Como se fossem besouros
Com suas bolas de fezes
Armazenando-as no subsolo
Para se banquetearem
Na eternidade
Ou enquanto
Suas riquezas... durarem.

Poesia criada em outubro de 1995, Arroio do Meio.

sábado, 30 de junho de 2012

Nostalgias

Outrora, índios senhores das matas
Em noites de prateado luar
Ao pé de lendárias cascatas
Ficavam à escuta dos guarás a uivar
Inimagináveis belezas fulgurantes
Mulheres morenas com lábios de mel
Sensuais, envolventes, insinuantes
Senhoras divinas com seus amantes
Vivendo nas matas, livres, estonteantes
Até que um dia maldito, um tropel
Cavalos, cavaleiros e mil demônios
Todos amargos com gosto de fel
Chegaram ao paraíso
Que enorme prejuizo
Difamaram aquele santuário
Como irracionais tudo destruiram
Que grande crime fizeram
Não se ouviu mais os guarás
Os papagaios, as gralhas azuis, os urus
O frescor das matas e a sua botânica
Vítimas da ação satânica
Desaparceram
Sumiram
Somente restou
Terra desnuda
Empobrecida
Ressequida
Sem valor
Sem amor
Sem vida.

Poesia criada em outubro de 1995, Arroio do Meio.

sexta-feira, 29 de junho de 2012

Mundo Real

Senhores abastados
Homens enclausurados
Prisioneiros do verbo TER
Homens limitados
De horizontes enlameados
De espaços demarcados
Com suas ricas mulheres
Cobertas por jóias e celulite
Intragáveis, despencadas, pretensiosas
De nariz empinado, maliciosas
No mais alto grau da fina elite.

Homens inteligentes
E suas mulheres atraentes
Aparecendo em alto estilo
Prisioneiros do verbo SER
Querendo mais, e mais poder
Como se sua espécie fosse eterna
Andando em seus carros fechados
Vidros escuros "para não ver"
O mundo ao seu redor
A miséria, o sofrimento, a dor
A desgraça, o desespero, o horror
E... a cara do mundo infame.

Ambos transgridem a Lei de Deus
Escarram nos semelhantes seus
Depois pedem clemência
Se dizem cheios de amor
Desde que... as mãos dos excluídos
Não maculem o verbo SER
E não subtraiam do verbo TER
Afinal...
Este é um mundo animal
Este é um mundo real.

Poesia criada em 3 de outubro de 1995, Arroio do Meio.

quarta-feira, 27 de junho de 2012

Divagação

No caminho, retratos
Sem vida, abstratos
Desvios adjacentes
Nada convincentes
Pintam à noite
Ocultam a lua
Disseminando incertezas
Ensaiando proezas
Pairando no ar...
E... a brisa morna, pesada
Encharcando a alma
Tirando-lhe a calma
Fazendo-a vagar ao léu
Bem longe do céu
Em busca de quem
Em busca de alguém
Que sirva de apoio
Que seque uma lágrima
Que traga consolo
Que diga amém
Que faça afagos
Sem causar estragos
Que faça adormecer
Estendendo o sentido de ser
Feliz
E... nada mais.

Poesia criada em setembro de 1995, Arroio do Meio.

Grande Homem

O grande homem vivia isolado
As grades da altura dos céus
Tão pontiagudas, espetavamos olhos de Deus
Desconhecia os semelhantes seus
Pensava ter vida eterna, coitado
Miserável, mesquinho, cercado
Amarrado à sua rica mansão
Não tinha ninguém por irmão
Em suas cobranças era sarcástico
Sem piedade, sem dor, fantástico
Desconhecia o sentido da palavra "amor"
Era único, absoluto, independente
Sabedor de tudo, onipotente
Mas...
Um dia o sino da igreja badalou
O grande homem tombou
Dele ninguém lembrou
A não ser pelo que cobrou
Ao cemitério alguns o levaram
Em seu túmulo não choraram
Com cimento seu corpo lacraram
E seu dinheiro também...
Nem uma flor
Nem uma dor
Nenhum amor
E... tudo passou.

Poesia criada em agosto de 1995, Arroio do Meio.