quarta-feira, 6 de junho de 2012

Texto de Despedida de Nova Prata

Por volta do ano 2.300, em algum ponto, o planeta Terra estará sendo sobrevoado por espaçonaves em viagem de exploração para estudos de antigas civilizações que aqui viveram. As visões que os exploradores terão serão as mais deploráveis possíveis. Nada mais estarão vendo que gigantescas ruinas semiencobertas por densos bosques. Aqui e acolá velhos cemitérios com suas cruzes calcificadas  indicando que um dia os humanos crucificaram  um Deus. Estarão vendo também o nada em que deu todo o orgulho e todas as ambições. 

Complexos multinacionais exploratórios responsáveis pela dizimação da raça pela fome, em satisfação da própria ganância, nada mais serão que uma inexistência longínqua, um nada na imensidão do universo. Toda visão nada mais será que uma volta ao passado de milhões de anos, onde o homem ainda não figurava e a paz reinava neste planeta. Não ouvirão mais que o sussurrar do vento e o baque das ondas do mar quebrando contra a rocha.

Colegas, estou dizendo tudo isso porque nós também nem lembranças seremos para quem quer que seja quando chegarem aqueles tempos. Talvez em algum ponto da terra se encontre algum  metal que foi de nosso uso, nada mais... os deuses de hoje ou os poderosos de hoje, os que mandam e desmandam nada mais serão que esquecimento total, iguais em tudo, ao mais nauseabundo mendigo que por aqui passou.
 
Tudo isto estou falando justamente no momento em que me está sendo prestada uma homenagem de despedida. Quis apenas situar toda nossa importância material, tão grandiosa quanto nossa própria ilusão. Se o material todo é perecível que restará de nós senão nossas boas ações, nossos gestos momentâneos, que tem um valor maior que milhões de dólares gastos em material bélico?

Colegas, se estamos vivendo o presente, nele eu vejo o passado e o futuro, pois eu tive, tenho e terei sempre comigo que a pessoa humana, acima de qualquer coisa tem sentimentos, sente suas saudades, de quem fica ou ficou, de quem parte ou de quem partiu.
 
Nesta noite, igual a tantas outras noites, levo dos senhores e de cada um em  particular, um gesto, uma atitude de satisfação.

Se no ano 2.300 não houverem mais festas de despedida e nem se ouvir mais roncosde motores e só forem ouvidos, pelos estranhos visitantes de estranhas espaçonaves, sussurros de ventos e baques de ondas do mar quebrando contra a rocha é porque nós também nada mais seremos que minúsculas partículas de pó em um deserto, restando apenas o inatingível que foram nossas ações que poderão, e porque não, ser a nova paz que reinará sobre este oásis que Deus nos deu.

Aos senhores, meus colegas, meu "até breve".

Texto de despedida da agência do Banrisul de Nova Prata, por ocasião da transferência para a cidade de Casca, em setembro de 1981.

Um comentário:

  1. Já estamos de volta ...o tempo passou depressa e até as pessoas já não são as mesmas...

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